Afinal, o que se sabe sobre o sumiço do pai do presidente da OAB

Fernando teria sido preso no prédio do Dops, em SP
Fernando teria sido preso no prédio do Dops, em SP Luiz Prado/19.abr.1989/AE

O caso de Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, foi um dos 168 analisados pela Comissão da Verdade Marcelo Rubens Paiva, instaurada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) entre 2012 e 2015. Após depoimentos, leitura de inúmeros documentos oficiais e textos retirados de livros e da imprensa, o grupo de trabalho chegou à conclusão que o ex-líder estudantil era, “conforme reconhecido oficialmente pelo Estado brasileiro, um desaparecido político" preso pelo regime militar.

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Segundo os depoimentos ouvidos pela Comissão da Verdade, o pernambucano Fernando estava morando em São Paulo no início da década de 1970, onde era funcionário público, e foi ao Rio no feriado de Carnaval de 1974 para visitar o irmão, Marcelo de Santa Cruz de Oliveira, morador do bairro do Flamengo. Na cidade, marcou de ver um amigo de infância, Eduardo Collier, que morava em Copacabana e também tinha atuação em grupos de esquerda. O encontro seria às 16h do dia 23 de fevereiro de 1974. “Ao sair, Fernando advertiu seu irmão que, caso não voltasse até 18h, teria sido preso”, registra o relatório final da Alesp.

Nesse mesmo dia, Fernando e Eduardo “foram detidos por agentes do DOI-CODI/RJ e desapareceram”. O apartamento de Eduardo foi invadido por agentes de segurança que não quiseram se identificar na portaria do edifício. Na ação teriam sido apreendidos, de acordo com relatos da época, livros “de conteúdo ideológico".

Fernando sabia que corria riscos em plena ditadura militar. O início de sua atuação política ocorreu no movimento estudantil secundarista em Pernambuco. Em 1968, chegou a ser preso em uma manifestação de rua contra o MEC (Ministério da Educação). Tinha, então, 20 anos — nasceu em Recife, em 20 de fevereiro de 1948.

Mudou-se para o Rio, onde ingressou e desistiu do curso de Direito da Universidade Federal Fluminense e acabou indo morar em São Paulo. Lá, enquanto trabalhava no Departamento de Águas e Energia Elétrica em São Paulo, teria conhecido integrantes da Ação Popular Marxista-Leninista (APML). Segundo consta no pedido de indenização e de reabertura das investigações, de 25 de março de 1996, assinado por seu único filho, o hoje presidente da OAB, seu pai “se dedicava a prestar assistência aos companheiros perseguidos e localizar os que eram sequestrados pelos órgãos de repressão e, por essa luta, acabou sendo, também, mais uma vítima somada à lista de sequestrados e desaparecidos”.

Fernando era casado com Ana Lúcia Valença Santa Cruz Oliveira e seu filho, Felipe, tinha apenas 2 anos de idade em 1974.

Após a prisão, as famílias de Fernando e Eduardo buscaram a imprensa e começaram a receber inúmeras versões desencontradas sobre o paradeiro dos dois ativistas. Inicialmente, teriam sido enviados a São Paulo, depois a Recife, mas nunca houve uma explicação clara de onde estavam.

Mesmo após levar essa denúncia a conhecimento de diferentes entidades e autoridades, a falta de respostas por parte do Estado brasileiro levou a família de Fernando a procurar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O regime militar, por sua vez, jamais admitiu a prisão de Fernando, alegando que este encontrava-se foragido e clandestino.

Segundo o relatório da Comissão da Verdade, o destino de Fernando teria sido contado no livro de 2012 “Memórias de uma Guerra Suja”, escrito por Rogério Medeiros e Marcelo Netto com depoimentos do delegado aposentado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Cláudio Guerra. Segundo ele, Fernando Santa Cruz e mais outros nove presos políticos foram mortos e seus corpos foram incinerados no forno da Usina de Açúcar “Cambayba”, localizada no município de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro. 

Cláudio Guerra confirmou as informações à Comissão Nacional da Verdade, em Brasília, no dia 23 de julho de 2014, e acrescentou que o corpo de Fernando foi transportado da chamada Casa da Morte, um centro clandestino de tortura e assassinato criado pelos órgãos do regime militar, localizado em Petrópolis (RJ) para a Usina Cambahyba. 

Na edição de 24 de março de 2004 da revista IstoÉ, também registrada pela Comissão da Verdade, o sargento Marival Chaves do Canto, ex-analista do DOI-CODI, relata que o coronel reformado José Brant Teixeira e o coronel Paulo Malhães “foram responsáveis pelo planejamento e execução de uma megaoperação em inúmeros pontos do país para liquidar, a partir de 1973, os militantes das várias tendências da Ação Popular (AP), movimento de esquerda ligado à Igreja Católica”. Segundo o ex-agente, entre os mortos estavam Fernando Santa Cruz Oliveira e Eduardo Collier Filho, além de  outros militantes da Ação Popular Marxista-Leninista (APML), movimento dissidente da AP.

 



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